Ensaios para Elaboração de Premissas para uma Nova Política
Ubirajara T Schier
Para pensar uma nova política, faz-se necessário antes de tudo, verificar a estrutura sobre a qual os pensamentos políticos estão fundamentados.
Essencialmente, os pensamentos políticos fundamentam-se em algum ponto de um eixo imaginário que parte do individualismo – em um dos extremos – para o coletivismo, em outro. Isso se dá em diversos aspectos da vida em sociedade, especialmente nas questões econômicas, morais e sociais, como mostra a figura abaixo:
“O individualismo é uma ideia ou visão que enfatiza o valor moral do individuo e entende que os objetivos e interesses de cada um devem prevalecer sobre os interesses dos grupos e do Estado. O individualismo valoriza a independência, a autonomia, a responsabilidade sobre si mesmo e a tolerância aos outros indivíduos; neste contexto, cada um deve se responsabilizar por suas ações e colher o sucesso ou o fracasso de suas decisões. Já o coletivismo é uma ideia ou visão que enfatiza o valor dos grupos e entende que seus objetivos e interesses devem prevalecer sobre os interesses dos indivíduos. O coletivismo valoriza a coesão dos grupos, a obediência, o altruísmo e o respeito à hierarquia; neste contexto, o grupo oferece segurança aos indivíduos em troca de lealdade.”(MATTOS. pg. 46-47)
O individualismo e o coletivismo, dessa forma, podem ser considerados como os alicerces estruturantes dos pensamentos políticos existentes que compõe por sua vez o que é conhecido por espectro político. Os pensamentos políticos limitam-se a variar, dessa forma, somente em função do grau de individualismo ou de coletivismo estabelecido como “a melhor solução” para determinado aspecto da vida. A figura abaixo mostrar a posição de algumas linhas de pensamento dentro do espectro político.
(MATTOS. pg. 25)
Outro fator importante, além do grau de individualismo e coletivismo nos diferentes aspectos da vida, são o que se denominam valores políticos. Conforme Mattos:
“Os valores políticos são importantes guias para a política. Dificilmente uma decisão governamental ou uma política pública são escolhas óbvias, somente com vantagens, dentro de um leque de opções claras. Grande parte da prática política é fazer o possível, e isto significa optar por caminhos menos que perfeitos e abrir mão de algo para atingir algum objetivo. Então o desafio passa a ser escolher qual o caminho a seguir, qual é o objetivo a ser atingido e o que estamos dispostos a abrir mão. Nestes momentos os valores políticos são guias fundamentais para orientar as escolhas que refletem o caráter da sociedade.
De todos os valores políticos os mais debatidos são a liberdade, a igualdade e a ordem. Mas ao contrário do que muitos pensam, estes valores não competem entre si e não são mutuamente excludentes: é perfeitamente possível haver uma sociedade com bons níveis de liberdade, igualdade e ordem, e os países escandinavos estão aí para provar, entre poucos outros. No entanto, é verdade que decisões tomadas para favorecer um valor podem prejudicar outro, como, por exemplo, medidas para aumentar a ordem e a segurança podem restringir a liberdade, enquanto que medidas para aumentar a igualdade também podem prejudicar liberdade, e vice-versa. Estes conflitos serão abordados mais à frente, quando serão discutidos os dilemas políticos.” (MATTOS. pg. 36)
Na figura abaixo, pode-se observar os posicionamentos dos principais pensamentos políticos em função da forma como os valores de Liberdade, Igualdade e Ordem são tratados:
Com base no espectro político, pode-se concluir que o melhor pensamento político para uma determinada sociedade é aquele que apresenta para ela a melhor combinação entre o grau individualismo ou de coletivismo aplicado nos diferentes aspectos da vida satisfazendo da melhor forma um equilíbrio entre os valores de liberdade, ordem e igualdade. De uma forma ou de outra, pode-se concluir também que qualquer pensamento político estará sempre limitado à combinação destas variáveis.
Para se pensar novas premissas para uma nova política é preciso, portanto, pensar em novas variáveis. Hoje percebe-se que a política está sempre “correndo atrás”, na tentativa de legislar as novas economias bem como também o seu impacto nas sociedades. Ou seja, as mudanças estão se originando em primeiro lugar nos eixos tecnológico, econômico e social, independente da política em vigor, para depois provocar as mudanças políticas necessárias.
É importante analisar qual o grau e velocidade das mudanças que estão ocorrendo nos eixos tecnológico, econômico e social e qual o grau e velocidade das mudanças que têm ocorrido no eixo político. Política e economia não deveriam andar juntas? Segundo Mattos:
“Decididamente este não é um livro sobre economia, mas não há como escapar deste assunto quando se trata de política: economia e política se misturam! Não é coincidência que este caráter eminentemente político da economia é refletido pelo nome original da disciplina, que era chamada de economia política. Longe de ser uma ciência, o estudo dos fenômenos econômicos necessariamente adota premissas e valores morais e políticos, que se tornam mais claros quando a economia é discutida e explicada pelas diversas correntes de pensamento político. Portanto, não é surpreendente que um dos principais assuntos do debate político atual é como estruturar e lidar com a economia. A economia tornou-se um assunto tão importante no meio político que o desempenho dela pode decidir uma eleição, contra ou a favor de quem está no poder. Números como o Produto Interno Bruto (PIB), inflação, desemprego, renda, taxa de juros e outros são monitorados atenciosamente pelo governo.” (MATTOS. pg. 27)
O que os fatos comprovam é que a política tem corrido atrás das chamadas das novas economias e do impacto social que a mesma tras consigo. Dessa forma, para ensaiarmos novas premissas faz-se justo analisar quais variáveis estão presentes nesta dinâmica de inovação e mudanças percebida nas novas economias.
A indústria fonográfica é um exemplo clássico do impacto da nova economia. Conforme Ori Brafman e Rod A. Beckstrom na obra “Quem está no comando?”
Entre outros exemplos tratados na obra, essencialmente, boa parte das mudanças da chamada nova economia consiste na mudança de um paradigma centralizado para um paradigma descentralizado. Ao primeiro atribui-se a modelo aranha e, ao segundo, o modelo estrela-do-mar. No modelo aranha, o poder é centralizado na cabeça. Assim, cortando-se a cabeça da aranha ela morre (na cabeça da aranha localiza-se o comando central). Já no modelo estrela-do-mar o poder é descentralizado, estando presente ao mesmo tempo em todos os tentáculos (não existe cérebro ou comando central). Cortando-se um tentáculo não somente nada acontece à estrela-do-mar como também depois de um tempo o mesmo regenera-se.
Essa transformação de estruturas centralizadas para estruturas descentralizadas foi também tratada por Paul Baran, em seu paper “On distributed communications” de 1964:
A questão que pode conduzir à novas premissas para novas políticas é até que ponto os sistemas políticos não deveriam seguir esses modelos econômicos descentralizados? No que, afinal, consistiria em um sistema político descentralizado? Seria, por exemplo, o Bitcoin, a moeda de uma economia, sociedade e política descentralizada?
Um caminho seria realizar um estudo comparativo entre as características das novas economias descentralizadas em relação ao eixo do individualismo e coletivismo políticos tratados anteriormente. Não formaria a centralização-descentralização um novo eixo a ser considerado na política? Não teria este novo eixo o mesmo impacto ou mesmo substituiria o eixo do individualismo/coletivismo? Que novo espectro político poderia ser construído a partir de um modelo considerando este novo eixo? Seriam essas novas premissas para constituição de um novo espectro político? Com certeza parece que sim.
REFERÊNCIAS
Mattos, Alessandro Nicoli de. “O Livro Urgente da Política Brasileira”. 3ª Edição – Dez/2017. Este livro está disponível gratuitamente em: http://www.politize.com.br/
Beckstrom, Rod. A. Quem está no comando?: a estratégia da estrela-do-mar e da aranha/Rod A. Beckstrom, Ori Brafman; tradução Márcia Nascentes – Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.
Franco, Augusto de. Vida e Morte das empresas na sociedade em rede. São Paulo: 2011.
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