REFERÊNCIA
RUIZ, Castor Bartolomé. A filosofia como forma de vida (III) : Do cuidado de si ao deciframento de si. Revista IHU On-line, São Leopoldo: Instituto Humanitas Unisinos. Ano XV. Nº467. 15 de Julho de 2015. Acesso em: 15/06/2022.
FICHAMENTO
#O cuidado de si
III – O cuidado de si, uma condição agônica
[…]
O agôn (luta, combate) era a marca do epiméleia heautoû. O sujeito que entrava neste caminho da filosofia como forma de vida sabia que o empenho por construir um estilo de existência não tinha um ponto final onde poderia parar, nem um paraíso vital onde poderia sentar-se para, simplesmente, desfrutar dessa existência. A filosofia como forma de vida propunha que a felicidade almejada era sempre uma conquista a ser feita, uma luta permanente por manter o patamar de excelência (virtude) que alguém poderia atingir no seu modo de vida. Optar por uma forma de vida significava adentrar-se numa condição agônica da existência. A vida filosófica não se limita a sobreviver biologicamente ou se conforma com suprir as meras necessidades primárias; essa vida deverá criar uma forma de existência própria ciente de que haverá de optar por uma condição agônica. Isso significa que, na forma de vida, o sujeito é impulsionado a uma tensão permanente de si para consigo, uma espécie de vigilância de si e de aprimoramento de si permanente. Da mesma forma que o atleta para manter seu condicionamento físico aprimorado é obrigado a praticar permanentemente os exercícios, a opção por uma forma de vida bela exige a condição agônica de praticar permanentemente as virtudes essenciais para essa forma de vida. A beleza estética da forma de vida exige a condição agônica da prática da virtude. Ética e estética estão conexas nesta forma de vida, porém ambas encontram-se perpassadas pela tensão agônica. (CASTOR, 2015. p.11)
IV – O cuidado de si e askese
Um terceiro aspecto comum às diversas escolas filosóficas no epiméleia heautoû encontra-se no objetivo principal da forma de vida filosófica, que se identifica com a liberdade. O rigor das askeses, a exigência das práticas de si, a severidade no estilo de existência tinha por objetivo possibilitar que o sujeito aprendesse a ser livre. A liberdade era entendida como o resultado final das práticas de si. Ninguém nascia sabendo ser livre, nem se concebia a liberdade como algo formal que todos temos ao nascer por direito – como é concebido nas sociedades modernas –, a liberdade era o resultado a conseguir na forma de vida. Ser livre significava não ser dominado pelos impulsos da natureza (vícios), nem pela influência dos outros (sociedade). Ser livre era o resultado da virtude do domínio de si (enkrateia) que habilitava o sujeito para conseguir o governo de si. (CASTOR, 2015. p.11)
V – A filosofia e a verdade
[…]
A verdade da filosofia como forma de vida é uma verdade que se torna verdadeira na medida em que o sujeito a assume como tal para si no seu modo de viver. Ao aceitar uma verdade, um valor, uma convicção, uma crença como verdadeira para sujeito, essa verdade se implica no modo de ser do sujeito a tal ponto que ela modifica sua vida na medida em que o sujeito tenta viver segundo essa verdade. É uma verdade cuja veracidade se comprova no modo como ela é vivida. (CASTOR, 2015. p.12)
[…]
VII
As escolas filosóficas antigas estavam convictas que a verdade filosófica era uma forma de veridição, uma forma de vida. Por isso, quando alguém entrava numa escola filosófica mudava de vida, optava por criar um estilo de existência e ser tornava discípulo. A filosofia moderna entende que a verdade é objetiva e científica e ensina a verdade como conhecimento e não como veridição ou forma de vida. Por isso, modernamente se aprende filosofia e não se vive filosoficamente. Alguém que se matricula num curso se torna aluno de filosofia e não discípulo de uma forma de vida. Talvez por isso a filosofia moderna cada vez mais está colonizada pelas verdades objetivas como única forma de verdade. (CASTOR, 2015. p.12)
#pierre hadot, foucault : filosofia como forma de vida e o cristianismo
VIII – O cuidado de si e o cristianismo
Foucault entende que foi na transição moderna para uma racionalidade objetiva e instrumental que operou definitivamente esta ruptura, o que ele denominou de “momento cartesiano”. Embora, segundo Foucault, a ruptura já ocorreu gradualmente com o predomínio da cultura cristã no ocidente. Hadot por sua vez sustenta que foi na hegemonia da teologia cristã sobre a filosofia que esta cedeu para aquela a tarefa de construir uma forma de vida, ficando para a filosofia a especulação racional dos conceitos. Cabe então perguntar-se qual a relação entre o cristianismo e a filosofia como forma de vida? Como ocorreu essa relação? (CASTOR, 2015. p.12)
Be the first to comment on "FICHAMENTO: RUIZ, Castor Bartolomé. A filosofia como forma de vida (III) : Do cuidado de si ao deciframento de si. Revista IHU On-line 467"