Existe uma diferença entre o novo Dilema de Marco e o anterior, discutido em aula.
No primeiro, precisávamos estabelecer um critério de triagem à respeito de quem, entre duas pessoas empatadas de acordo com critérios técnicos, viria a ocupar um único leito de UTI disponível.
Minha resposta: Supondo que João e Pedro apresentem a mesma pontuação de SOFA, eu faria entre eles um sorteio para decidir quem ocuparia o único leito de UTI disponível.
Neste, a situação é diferente. João, que está ocupando um leito de UTI apresenta um quadro clínico bem menos favorável que Pedro que está aguardando uma vaga na emergência. A pergunta é se, visando o objetivo de salvar o maior número de vidas possíveis, devemos remover João do leito de UTI para possibilitar que Pedro o ocupe.
Utilizo para fundamentar minha resposta, o Dilema de Trolley:
Para responder à essa pergunta, associarei o Dilema de Trolley à cada um dos Dilemas de Marco:
– No primeiro dilema de Marco, o bonde está parado mas logo entrará em movimento, obrigando-nos a escolher entre A e B;
Na minha resposta ao dilema 1 de Marco, utilizando o SOFA e o método aleatório, esquivei-me de precisar escolher que vida salvar. Mas a decisão era como se tanto em A como em B tivéssemos apenas uma pessoa. Agora, entretanto, a proporção é de 5 para 1. Nesse caso, pelo critério de salvar mais vidas, não ocorre o empate e a decisão é de mover a alavanca de forma que o bonde, ao se colocar em movimento, desvie do trilho A.
– No segundo dilema de Marco, o bonde está em movimento e, se nada for feito, ele seguirá o trilho A, matando 5 pessoas;
Agora, no dilema 2 de Marco, se nenhuma escolha for feita, 5 pessoas inevitavelmente morrerão e a pessoa em B sobreviverá. O bonde já está em movimento em direção ao trilho A e pouco tempo resta para se tomar uma decisão. Aqui, nossa escolha têm o poder de modificar o resultado já esperado, podendo, nesse caso, salvar as 5 pessoas do trilho A mas ao mesmo tempo causar a morte da pessoa no trilho B.
Existe entretanto uma diferença: no primeiro caso, em que o bonde está parado, não temos a possibilidade da “não-escolha”, ou seja, o bonde irá se colocar em movimento e uma escolha precisa ser feita. No caso de João e Pedro no primeiro dilema de Marco, ambos com o mesmo SOFA, é como se no trilho A tivéssemos João e no trilho B, Pedro. Ambos apresentam as mesmas chances de sobreviver ao impacto do bonde, logo, o sorteio determinará para que trilho o bonde deve seguir.
Já no segundo caso, em que o bonde já está em movimento e avançando sobre o trilho A, existe a possibilidade da “não-escolha”. A pessoa que está no trilho B se encontra à salvo (no caso da UTI, podemos admitir que embora ela irá levar mais tempo para se recuperar, ela ainda assim irá se recuperar). Assim, se fizermos uma escolha, não estamos escolhendo entre o melhor critério com o objetivo de salvar mais vidas, mas sim adotando um critério que implica determinar que vida é mais importante (pois estamos somente trocando uma vida por outra).
Obviamente não existe a situação em que o leito de UTI ocupado por João pudesse – caso este fosse removido – ser ocupado por 5 pessoas ao mesmo tempo. Mas caso fosse, eu diria que sim, a vida de 5 pessoas é mais importante que de apenas 1 e, assim, removeria João do leito de UTI se essa condição fosse possível.
Mas a situação é diferente:
O bonde está em movimento, seguindo o trilho A. Se nenhuma escolha for feita, João que já se encontra no leito de UTI irá se recuperar e sobreviver. Pedro, por sua vez, por não ter acesso ao leito de UTI, irá morrer na sala de emergência. Nesse caso, ao não escolhermos, não assumimos a responsabilidade em determinar qual vida é mais importante.
Dessa forma, existe uma diferença entre o dilema 1 e 2 de Marco. No primeiro existe uma necessidade de escolha. Minha escolha foi com base em critérios técnicos (SOFA e sorteio); No segundo, se adotarmos o mesmo critério técnico, me veria obrigado a escolher a desviar o bonde do trilho A para o trilho B, removendo João da UTI e provando sua morte para assim salvar Pedro. Se fizer essa escolha, estou dizendo entretanto que João, que está à salvo (aparentemente) deve morrer no lugar de Pedro. Aqui eu estaria decidindo qual vida é mais importante.
Minha resposta e minha escolha, portanto, é a de não-escolher. Mantenho assim João a UTI, procurando ao máximo sua melhora e a desocupação da vaga para que esta possa ser ocupada por Pedro. Dessa forma, João estará à salvo e é possível que Pedro ainda tenha uma chance de se recuperar e sobreviver (ainda que suas condições tenham piorado durante a espera do leito). Pedro entretanto, pode morrer aguardando o leito de UTI. É infelizmente… aconteceu o que já era esperado.
Very good!
Bira, teu ponto sobre a diferença entre Marco 1 e 2 foi muito original. A questão parece ser: em Marco 1, o sujeito não é convidado a decidir sobre qual “vida” é mais importante. Ambas encontram-se em pé de igualdade nesse aspecto. Em 2, no entanto, ao decidir por uma delas, decide-se que uma é mais importante. É isso?
Sim, é isso mesmo. Penso que evitando julgamentos podemos tomar uma decisão e ficar em paz com nossa consciência.