Fichamento: D. Coutinho: Contratos & Virtudes II. Normatividade e Agência Moral

Contratos & Virtudes II

Normatividade e Agência Moral


COUTINHO, Denis. Contratos & Virtudes II. Normatividade e Agência Moral. São Paulo. Edições Loyola, 2021.


RESUMO

Introdução

A ideia central que defenderei neste livro diz respeito à urgência em se diferenciar a autoridade normativa da esfera privada em contraposição à autoridade normativa da esfera pública, pensando mais especificamente no âmbito da moralidade. Procurarei conectar essas duas esferas em uma teoria mista que faça uso de critérios prescritivos tanto de uma ética das virtudes quanto de uma ética neocontratualista. O ponto central será defender que apenas uma teoria moral e política mista poderá harmonizar adequadamente essas duas exigências, a saber, uma exigência normativa tanto em primeira quanto em segunda pessoa.

Segue um exemplo do que estou considerando:

Quando um agente é demandado a ser resiliente, ou mesmo a ter lealdade ou ser moderado, a autoridade em questão é claramente pessoal, de forma que seria o próprio agente a ter que exigir de si mesmo certo tipo de comportamento e caráter virtuoso, sendo a felicidade uma questão que envolveria particularmente a deliberação e a decisão individual. Por outro lado, quando os agentes são demandados a obedecerem à lei – por exemplo, o código de trânsito brasileiro, que condena atos de imperícia, negligência e imprudência -, a autoridade em questão não parece ser pessoal, mas social, de forma que seria a própria deliberação da comunidade que exigiria do sujeito certo tipo de comprometimento e atitude, e isso garantiria a felicidade da coletividade.

(COUTINHO, p. 15)

A PROPOSTA DE UMA TEORIA MORAL MISTA

Posto que minha proposta é desenvolver uma teoria moral e política mista, que possa conectar diferentes critérios normativos, tanto em primeira pessoa quanto em segunda pessoa, se faz necessário um esclarecimento inicial sobre o papel e o escopo de uma teoria moral. Em minha interpretação, o papel inicial de uma teoria moral e política é esclarecer para os agentes como eles mesmos julgam moralmente as atitudes e o caráter dos sujeitos, isto é, por meio de juízos de aprovação e desaprovação das ações e comprometimentos, elogiando aquelas que foram aprovadas e censurando as desaprovadas, e apontar para as possíveis contradições que possa se identificar nesses julgamentos.

A ideia básica é que uma teoria moral possa oferecer certos critérios normativos, tais como princípios ou mesmo virtudes morais, para o agente poder utilizá-los como referência prescritiva a fim de corrigir ou revisar as suas crenças morais – e isso com base em um entendimento adequado do próprio fenômeno moral. O método do equilíbrio reflexivo, portanto, terá destaque nessa proposta, bem como os exemplos. Também é importante frisar que uma teoria normativa, como uma teoria moral contratualista das virtudes, ou uma teoria política liberal-comunitarista, deve ser esclarecida por pressupostos metaéticos, tais como ontológico, epistemológico, semântico e psicológico, bem como deve servir para resolver certos problemas práticos, tais como a fundamentação da democracia e dos direitos humanos e o da justificação da punição legal.

(COUTINHO, p. 17)

APERFEIÇOAMENTO DO PENSAMENTO MORAL

Um dos principais erros que se pode cometer ao se interpretar o conhecimento no campo da moralidade é querer tomá-lo como um conhecimento de tudo ou nada, isto é, ou se saberia absoluta ou infalivelmente o que é certo e errado, bom e mau, justo e injusto em cada situação cotidiana, ou se teria que decidir o que fazer ou como viver de forma puramente subjetiva, sem poder contas com nenhum critério normativo objetivamente garantido para auxiliar nas deliberações morais cotidianas. Creio que essa maneira de abordar a questão encobre a própria especificidade da ética que, como já dizia Aristóteles, corretamente, não pode ser considerada com o mesmo grau de exatidão que a matemática e a física, mas, ainda assim, pode ser classificada sob o domínio da ciência, mesmo que da ciência prática. Essa especifidade revelaria que a ética é um tipo de conhecimento cercado por diversidade de opiniões e incertezas sobre o bom e o justo, mas que pode auxiliar os indivíduos a melhor decidir em casos complexos e agir de forma apropriada, que seria a virtuosa, em razão de ela indicar a verdade de forma aproximada e em linhas gerais, estando esse conhecimento ligado intrinsicamente à experiência dos agentes.

Em Nicomachean Ethics, Aristóteles exemplificaria essa complexidade ética dizendo que a coragem e a riqueza são tomadas geralmente como bens, mas que há casos de pessoas que pereceram devido a elas. Assim, já poderia ser tomado como um tipo de conhecimento o saber de que a coragem e a riqueza são bens geralmente, mas que não são bens quando forem prejudiciais aos agentes.

Esse exemplo já mostra que o conhecimento moral pode incluir princípios tanto gerais quanto universais, bem como a experiência particular dos agentes. Por exemplo, pode incluir princípios morais generalizantes que informariam que a coragem é um bem geralmente, isto é, na maior parte das vezes. E, também, poderia contas com a experiência de um sujeito particular que pereceu por causa da coragem, talvez em certo conflito ou ameaça, além de poder contar, igualmente, com um princípio universal que diria que a coragem não é um bem quando for prejudicial ao sujeito. De posse desses princípios morais e da experiência, além de contar com uma capacidade deliberativa para pesar as diversas razões identificadas em um caso e escolher o melhor curso de ação, que seria aquele que realizaria o fim bom, o agente poderia decidir agir de forma corajosa, por exemplo, mesmo com o risco existente de ela ser prejudicial, mas pesando as razões adequadamente, nas circunstâncias específicas que caracterizam uma deliberação particular.

(COUTINHO, p. 74)

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