Artigo: McDowell – Sellars and the space of reasons

Sellars e o Espaço das Razões
JOHN MCDOW ELL

RESUMO: Em Empiricism and the Philosophy of Mind, Sellars introduz a imagem do espaço de razões e delineia um empirismo não tradicional, não contaminado pelo Mito do Dado. Brandom considera a deriva de Sellars como sendo contra o empirismo como tal, contra a própria ideia de que algo merecedor de ser chamado de “experiência” poderia ser relevante para a aquisição de conhecimento empírico de qualquer forma, exceto meramente causalmente. Neste artigo, ataco a ideia de Brandom de que, de qualquer forma, precisamos de uma concessão ao externalismo para conhecimento não inferencial e sugiro que, no espaço de razões de Sellars, a experiência desempenha um papel mais do que meramente causal em uma epistemologia de observação totalmente internalista.

§1. Foi Wilfrid Sellars quem introduziu a imagem do espaço das razões. Em um momento importante em “Empiricism and the Philosophy of Mind”,1 ele escreve que “ao caracterizar um episódio ou um estado como o de conhecer, não estamos dando uma descrição empírica daquele episódio ou estado; estamos colocando-o no espaço lógico das razões, de justificar e ser capaz de justificar o que se diz” (§36).

Caracterizar um episódio ou estado como um de conhecimento seria afirmar que um fato epistêmico obtém, para usar a linguagem que Sellars explora em outro lugar. A observação sobre o espaço lógico de razões se encaixa com o que ele disse, em um espírito promissório, perto do começo do artigo (§5):

[A] ideia de que fatos epistêmicos podem ser analisados ​​sem deixar vestígios — mesmo em princípio — em fatos não epistêmicos, sejam eles fenomenais ou comportamentais, públicos ou privados, não importa quão abundante seja a pitada de subjuntivos e hipóteses, é, acredito eu, um erro radical — um erro de uma peça com a chamada “falácia naturalista” na ética.

Em outro ponto (§17), onde ele deve querer ecoar essa invocação da falácia naturalista, Sellars trabalha com um contraste entre fatos epistêmicos e fatos naturais. Presumivelmente, esse contraste se alinha com o contraste ao qual ele apela na observação com a qual comecei, entre colocar um episódio ou estado no espaço de razões e dar uma descrição empírica dele. (Voltarei a isso.)

Sellars está aqui endossando uma versão do pensamento de que o conceito de conhecimento pertence a um contexto que é, em pelo menos algum sentido, “normativo”. Ele glosa o espaço das razões como o espaço de justificar e ser capaz de justificar o que se diz. Saber que as coisas são assim e assim, pode-se dizer, é estar em posição de afirmar que as coisas são assim e assim com um certo tipo de direito. Então, o ponto de invocar o espaço das razões aqui é apresentar uma versão da concepção tradicional de conhecimento como crença verdadeira justificada.

§2. Mas a imagem tem um escopo mais amplo do que sua aplicação ao conceito de conhecimento. Na interpretação mais óbvia, controlada pela etimologia da palavra “epistêmico”, fatos epistêmicos seriam restritos aos fatos que figuram na observação em que Sellars introduz a imagem: fatos no sentido de que algum episódio ou estado é de conhecimento. Mas em alguns lugares em “Epistemologia e a Filosofia da Mente” Sellars deixa claro que sua preocupação se estende mais amplamente do que epistemologia no sentido etimologicamente óbvio, reflexão sobre conhecimento.

O contraste entre fatos epistêmicos e fatos naturais surge em uma passagem em que o ponto é insistir que um fato no sentido de que algum objeto parece vermelho para alguém é um fato epistêmico em vez de um fato natural (§17). E um episódio ou estado em que algo parece vermelho para alguém não é um de conhecimento. (Certamente não um de saber que a coisa é vermelha. Talvez o sujeito de tal estado ou episódio saiba que algum objeto parece vermelho para ele, mas isso não torna o fato de parecer vermelho para ele em si um episódio ou estado de conhecimento.) Ainda mais impressionante, Sellars escreve sobre o “caráter epistêmico” da expressão “pensar em uma cidade celestial” (§7). Nessa conexão, ele iguala “caráter epistêmico” à intencionalidade.

Então, “epistêmico”, no uso de Sellars, adquire um sentido que se desprende de sua conexão etimológica com o conhecimento. No sentido mais amplo, fatos epistêmicos se relacionam ao pensamento direcionado ao mundo como tal, seja envolvendo conhecimento ou não. Quando ele sugere que estados ou episódios de olhar são epistêmicos, seu ponto é que experiências visuais são “pensamentos” no sentido que ele explica no final do artigo (§§56–9: veja §60 para a aplicação a “episódios perceptuais internos”). A essa altura, ele está se concentrando em episódios em vez de estados, e “pensamentos” são episódios “internos” que possuem conteúdo conceitual, de uma forma que deve ser entendida modelando-os em performances linguísticas evidentes. Uma experiência na qual algo parece vermelho para alguém incorpora o pensamento de que a coisa em questão realmente é vermelha. (Veja §16 para a ideia de experiências como, “por assim dizer, fazendo” afirmações ou reivindicações.)

Então a observação sobre o espaço de razões generaliza. Ao caracterizar um episódio ou um estado em termos de atualização de capacidades conceituais, como fazemos quando dizemos que alguém está pensando em uma cidade celestial, ou que algo parece, por exemplo, vermelho para alguém, estamos colocando o episódio ou estado no espaço lógico de razões, não menos do que quando caracterizamos um episódio ou um estado como um de conhecimento.

Acho útil ver essa forma generalizada do ponto como antecipando algo que Donald Davidson coloca ao dizer que conceitos de atitudes proposicionais operam sob um “ideal constitutivo de racionalidade”.2 Davidson diz isso ao insistir que não podemos esperar que aplicações de conceitos de atitudes proposicionais se alinhem de forma ordenada com descrições de seus complacentes em termos de, por exemplo, neurofisiologia. Isso corresponde à negação de Sellars de que fatos epistêmicos — que, no sentido estendido de Sellars, correspondem muito bem aos fatos destacados por envolverem o que Davidson chama de “atitudes proposicionais” — podem ser analisados ​​sem resto em fatos não epistêmicos. E Davidson sugere um argumento para a alegação de irredutibilidade que é mais ou menos comum entre ele e Sellars.

O argumento é que colocar itens no espaço de razões, para colocar em termos sellarsianos, serve ao propósito de exibir fenômenos como tendo um tipo bastante especial de inteligibilidade, o tipo de inteligibilidade que um fenômeno é revelado como tendo quando nos permitimos vê-lo como manifestando responsividade a razões como tal. (“Como tal” importa aqui. Voltarei a isso.) Um caso óbvio é a inteligibilidade que encontramos no comportamento quando o vemos como ação intencional, situando-o no contexto dos desejos e crenças que o informam. Mas é claro que crenças e desejos em si podem ser tornados inteligíveis como manifestações de uma responsividade a razões por parte de seus possuidores. Colocamos crenças e desejos no espaço de razões ao colocá-los em um contexto que inclui outras crenças, outros desejos e avaliações, à luz dos quais as crenças e desejos que estamos tentando entender são revelados como manifestações de racionalidade por parte de seus possuidores. Falar do espaço de razões captura em termos metafóricos o tipo distinto de padrão no qual situamos as coisas quando as explicamos dessa maneira distinta. E a sugestão de Davidson é que esse tipo de padrão é tão especial que não há perspectiva de formular o conteúdo de conceitos cujo ponto primário reside em sua disponibilidade para colocação no espaço de razões em termos de nada além de conceitos que não têm isso como seu ponto primário.

Para marcar esse caráter especial da inteligibilidade do espaço-de-razões, Davidson a coloca em contraste com o modo de inteligibilidade buscado por disciplinas como a física. Em, digamos, mecânica, tornamos fenômenos inteligíveis ao revelá-los como instâncias de maneiras pelas quais as coisas acontecem regularmente, maneiras pelas quais as coisas se desdobram em conformidade com as leis da natureza. Isso é bem diferente de tornar fenômenos inteligíveis ao revelá-los como esforços por parte dos sujeitos para se conformarem às exigências da racionalidade. Presumivelmente, quando Sellars invoca a natureza, em seu contraste entre o epistêmico e o natural, ele quer nos fazer lembrar de alguma concepção do que ele quer que vejamos como o contraste para colocar as coisas no espaço das razões. A conversa de Sellars sobre fatos naturais aponta para um tipo de inteligibilidade que é característica, se não da física em particular, pelo menos das ciências naturais em geral.

E quando Sellars contrasta a colocação de coisas no espaço de razões com a descrição empírica, o ponto deve ser sugerir que a descrição empírica é restrita ao que buscamos quando colocamos coisas na natureza em alguma concepção desse tipo. Essa conversa sobre descrição empírica talvez seja infeliz. Está longe de ser óbvio que afirmar o que Sellars chama de “fatos epistêmicos” não pode ser fundamentado na experiência, e quando é, não há razão clara para não contar a afirmação de um fato epistêmico como empírico. E se empírico, por que não descrição? Talvez Sellars tenha deixado sua formulação aqui distorcida pelo fato de que uma maneira pela qual ele tenta transmitir seu ponto é aludindo à falácia naturalista na ética. Em algumas versões da alegação de uma falácia naturalista naquele contexto, seu lar original, a ideia é que a descrição está de um lado de um abismo intransponível, com avaliação ou apreciação em termos de conformidade com normas do outro. Devemos notar, no entanto, que quando Sellars sugere seu análogo para evitar a falácia naturalista na ética, ao negar que podemos reduzir fatos epistêmicos a fatos não epistêmicos, ele não carrega para seu contexto análogo a ideia de que o que, sob pena de falácia, devemos reconhecer como irredutível ao natural não é factual. Fatos epistêmicos também são fatos. Então, qualquer sugestão de que afirmá-los não pode ser envolver-se em descrição seria no mínimo estranha, segundo as próprias luzes de Sellars.

Em todo caso, acho que seria um erro tentar trazer a especialidade da inteligibilidade do espaço–de–razões em relevo contra uma concepção monolítica de inteligibilidade que não é do tipo espaço–de–razões. A inteligibilidade não se divide exaustivamente no tipo espaço–de–razões, por um lado, e o tipo que é buscado pela física, o contraste favorito de Davidson, por outro. Talvez seja melhor trazer a inteligibilidade do espaço–de–razões em foco contrastando-a com a inteligibilidade que corresponde à compreensão natural-científica em geral, como na minha leitura sugerida do contraste de Sellars de fatos epistêmicos com fatos naturais. Mas esse contraste não requer uma concepção unificada de um tipo de inteligibilidade que corresponde à compreensão natural-científica, comum entre a física e, digamos, a biologia. O pensamento básico é que colocar no espaço de razões é especial por ser bem diferente de qualquer outra maneira de revelar fenômenos como inteligíveis. Não há necessidade de uma caracterização da inteligibilidade que não seja do tipo espaço-de-razões, mais específica do que isso, que não seja do tipo espaço-de-razões.

Aqui estou corrigindo uma linha que já havia tomado anteriormente. No meu livro Mind and World,3 quando tentei capturar a ideia sellarsiana de que colocar no espaço de razões é especial, fiz isso apelando para um contraste com colocar no reino da lei natural, o tipo de coisa que fazemos na mecânica. Até aqui, talvez esteja tudo bem. Há de fato um contraste nítido aí. Mas subsumir sob lei deve figurar apenas como um exemplo particularmente vívido de uma maneira de revelar inteligibilidade que seja diferente de colocar no espaço de razões; enquanto deixei isso parecendo como se colocar fenômenos no espaço de razões e subsumi-los sob lei natural devessem esgotar as possibilidades alternativas para encontrar coisas inteligíveis.

§3. Sellars glosa o espaço lógico das razões como o espaço de justificar e ser capaz de justificar o que se diz. Parafraseei isso dizendo que saber que as coisas são assim e assim é ter um certo tipo de direito de dizer que as coisas são assim e assim. Claro que isso não implica que um conhecedor precisa dizer que as coisas são assim e assim para contar como conhecedor. A questão é apenas que se ela dissesse que as coisas são assim e assim, ela teria direito à sua declaração. Como eu disse, Sellars está apresentando uma versão da concepção tradicional de conhecimento como crença verdadeira justificada, crença verdadeira à qual o crente tem direito.

Mas importa que Sellars introduza o espaço das razões como um espaço ocupado por falantes, pessoas que podem dizer coisas e justificar o que dizem. Pelo que eu disse até agora, pode parecer que o espaço das razões também pode ser ocupado por não-falantes. Pode parecer que relações justificatórias entre coisas que se pode dizer figuram apenas como um caso particularmente marcante de relações justificatórias em geral, que, por esse motivo, podem igualmente se manter entre posturas ou quadros mentais adotados por animais que não usam a linguagem. Mas ler Sellars dessa forma seria ignorar o papel em seu pensamento do que ele chama de “nominalismo psicológico” (ver §§29, 31).

O nominalismo psicológico é a tese de que “toda consciência de tipos, semelhanças, fatos, etc., em suma, toda consciência de entidades abstratas — na verdade, toda consciência até mesmo de particulares — é um assunto linguístico” (§29). Temos a tendência de imaginar uma criança, aprendendo sua primeira língua, como já em casa em “um espaço lógico de particulares, universais, fatos, etc.” (§30). Nessa imagem, aprender uma língua pode ser uma questão de simplesmente associar palavras e frases a esses objetos de consciência já disponíveis. Contra isso, o nominalismo psicológico de Sellars nega “que haja qualquer consciência de espaço lógico anterior ou independente da aquisição de uma língua” (§31). Portanto, o conhecimento, em um sentido que implica consciência de “espaço lógico”, pode ser apreciado apenas por sujeitos que são competentes em uma língua. E quando Sellars conecta estar apropriadamente posicionado no espaço das razões com ser capaz de justificar o que se diz, isso não é apenas uma questão de destacar uma instância particularmente marcante de ter uma crença justificada, como se essa ideia pudesse se aplicar igualmente bem a seres que não podem dar expressão linguística ao que sabem. Sellars sugere que ele vê essa concepção do significado de ter uma linguagem como semelhante à polêmica de Wittgenstein contra a imagem “agostiniana” da linguagem em Investigações Filosóficas.4 (Veja §30, onde ele coloca o nominalismo psicológico em oposição a uma maneira diferente de retratar “uma criança —ou um portador de placas— aprendendo sua primeira língua”, e sugere que essa imagem alternativa produz uma explicação “agostiniana” do pensamento na presença.)

Sellars coloca o nominalismo psicológico em prática em seu tratamento de “pensamentos”, no sentido de episódios “internos” com conteúdo conceitual. Ele explica a ideia de tais episódios dando uma reconstrução racional — que ele enquadra como um mito próprio para contrariar o Mito do Dado — de como a ideia poderia ter sido introduzida. Ele começa com “nossos ancestrais Ryleanos”, que têm uma linguagem rica para falar sobre a realidade publicamente acessível, incluindo características disposicionais de objetos nela, mas nenhuma linguagem para falar sobre ocorrências “internas” (§48). Para abrir espaço para o próximo movimento na história de Sellars, eles precisam da capacidade de falar sobre seu próprio comportamento verbal, em particular a habilidade de creditar a ele características semânticas. O mítico Jones de Sellars agora introduz episódios “internos” com conteúdo conceitual como postulados em uma teoria construída para explicar o comportamento aberto. Positos normalmente vêm com um modelo, que entra essencialmente em como devemos entender o conceito dos itens postulados. No caso de “pensamentos”, o modelo são performances linguísticas abertas, com suas características semânticas; é por isso que os “ryleanos” precisam ter uma conversa sobre discurso significativo já em mãos, como uma base na qual Jones pode equipá-los com o conceito de episódios “internos” com conteúdo conceitual. Episódios “internos” com conteúdo conceitual devem ser entendidos no modelo de performances abertas nas quais as pessoas, por exemplo, dizem que as coisas são assim e assim. A direção à realidade do comportamento verbal aberto fornece o modelo no qual devemos entender a direção à realidade de episódios conceituais não abertos.

Desde Platão, os filósofos ficaram impressionados com o quão natural é conceber o pensamento que se guarda para si mesmo, em oposição a pensar em voz alta, como discurso interior. O que é distintivo sobre a versão de Sellars do ponto é uma imagem particularmente clara do significado dessa concepção natural. A sugestão não é, por exemplo, que pensar de outra forma que não em voz alta é se envolver em imagens verbais. Sem dúvida, pode-se envolver em imagens verbais quando se pensa, mas não é isso que Sellars está nos dizendo que pensar é. A sugestão é, ao invés disso, que o conceito de pensar de outra forma que não em voz alta é essencialmente analógico em caráter, essencialmente para ser compreendido como uma aplicação estendida do conceito de dizer coisas ou pensar em voz alta.

§4. Propus que deveríamos conectar a ideia de posicionamentos no espaço de razões com a ideia de um tipo especial de inteligibilidade, exemplificada pela compreensão de pedaços de comportamento em termos de crenças e desejos, como fazemos quando vemos o comportamento como uma ação intencional.

Agora é fácil pensar que não pode ser certo restringir esse tipo especial de inteligibilidade aos usuários da linguagem. E, de fato, esse protesto está no caminho de algo correto, e será útil satisfazê-lo um pouco.

Animais que não usam a linguagem agem de maneiras que podemos tornar inteligíveis para nós mesmos ao ver como seria atraente agir como eles estão agindo, dados seus desejos e sua consciência de sua situação. A inteligibilidade que conferimos dessa forma a um pedaço de comportamento — digamos, evitar o perigo ou buscar uma oportunidade de comer — tem um caráter que não pode ser claramente separado de uma ideia de racionalidade ou justificação, especialmente se o comportamento for, digamos, inventivo ou engenhoso, como o mero comportamento animal pode ser, em vez de apenas rotineiro. Um animal que evita o perigo não está meramente fazendo o que lhe é natural, embora certamente esteja fazendo isso; está fazendo o que faz sentido para ele fazer, dada sua situação. E as consciências das circunstâncias ambientais que figuram nessa maneira de tornar o comportamento animal inteligível são, até certo ponto, como as consciências das características de seu ambiente que são apreciadas por seres como nós, que podem dizer como eles, por exemplo, veem que as coisas são, dando assim expressão ao conhecimento que se pretende que esteja dentro do escopo da observação de Sellars de que atribuir conhecimento é fazer uma colocação no espaço de razões. Um animal que vê um predador, por exemplo, certamente está em algum sentido justificado em se considerar em perigo, de uma forma que não é completamente diferente da forma como um ser humano que vê um veículo vindo em sua direção, por exemplo, pode ser justificado em se considerar em perigo, e talvez em dizer que está em perigo. Quando tornamos animais que não usam a linguagem inteligíveis nas formas que normalmente fazemos, usamos aparatos conceituais de ação, desejo ou propósito, crença e, às vezes, conhecimento, que, pelo menos até certo ponto, corresponde ao aparato conceitual que se enquadra no escopo das alegações de Sellars, explícitas e implícitas, sobre o espaço de razões. Algo como o que Sellars diz sobre a irredutibilidade do aparato conceitual que o preocupa parece plausível aqui, e pelo que parece ser pelo menos uma razão similar. Esse aparato conceitual tem seu lar primário no contexto de uma maneira de tornar fenômenos inteligíveis que é controlada por uma ideia do que faz sentido, uma ideia que é pelo menos semelhante a um conceito de racionalidade. Então por que não deveríamos supor que explorar esses conceitos em aplicação a animais não linguísticos é colocar coisas no espaço de razões? O que há de tão especial na linguagem?

A história de Sellars sobre modelar conceitos de posturas psíquicas não expressas em conceitos de atos de fala não responde por si só a essa questão. O que Sellars propõe é que o conceito de, por exemplo, consciência perceptiva de que as coisas são assim e assim deve ser entendido no modelo do conceito de, por exemplo, dizer que as coisas são assim e assim. Alguém pode conceder isso, sem necessariamente aceitar que os conceitos modelados podem ser aplicados apenas a sujeitos aos quais temos ocasião de aplicar os conceitos nos quais eles são modelados. Por que não deveria haver conceitos, em última análise modelados em conceitos de atos de fala, que podemos aplicar a animais que não usam linguagem, bem como a animais que o fazem?

Acredito que podemos aceitar algo nesse sentido, mas ainda manter a ideia sellarsiana de que a aquisição da linguagem faz uma diferença marcante.

O espaço de razões no sentido primário é, como eu disse antes, o espaço de razões apreciadas e respondidas como tal. Prometi retornar ao significado desse “como tal”. É verdade que um animal que não usa linguagem pode responder a algo à luz do qual sua resposta faz sentido. Considere, por exemplo, fugir do perigo. Isto é, se você preferir, responder a algo que é de fato uma razão para a resposta — para colocar as coisas de uma forma perfeitamente inteligível que leve à inclinação que estou considerando, para resistir à restrição do espaço de razões a seres com linguagem. Mas no caso de um animal sem linguagem, a circunstância que é de fato uma razão não é respondida como a razão que é. Para que esse tipo de locução se encaixe, no sentido em que pretendo, o sujeito precisaria ser capaz de se afastar do fato de que está inclinado em uma certa direção pela circunstância. Ele precisaria ser capaz de levantar a questão se deveria estar inclinado assim, e concluir que deveria. Agir sobre a inclinação — supondo que o veredito da investigação que é aberta por esse recuo seja positivo — agora assume uma dimensão de liberdade. Dependia do agente agir ou não. O comportamento não é mais o mero resultado de forças que fazem parte da natureza de um animal. É natural dizer que essa dimensão de liberdade é necessária se o comportamento deve ser, em um sentido adequado, informado pela racionalidade. E essa orientação distanciada em relação a circunstâncias que, de outra forma, teriam simplesmente induzido inclinações é possibilitada pela linguagem. É a capacidade de dizer como as coisas são que permite que alguém mantenha uma circunstância com tendência a influenciar suas motivações à distância, de modo a ser capaz de se perguntar se ela constitui uma razão para fazer o que ela inclina alguém a fazer.

Então, se ocupar o espaço das razões no sentido primário é ser capaz de responder a razões apreciadas como tais, então somente usuários da linguagem podem ocupar o espaço das razões no sentido primário. Mas isso é sem prejuízo da legitimidade de encontrar um parentesco entre o tipo de nexo explicativo no qual colocamos ação intencional empreendida por razões e o tipo de nexo explicativo no qual colocamos comportamento proposital empreendido por animais que não podem ter o tipo de atitude distanciada em relação a seus dilemas que a linguagem torna possível.

Então, podemos adotar uma visão “nominalista” sellarsiana do espaço de razões estritamente assim chamado, mas ainda reconhecer que o espaço de razões é curiosamente similar em alguns aspectos a um espaço explicativo já ocupado por animais sem linguagem. Isso nos permite levar muito a sério o quão natural é creditar aos animais que não usam linguagem propósitos e consciências. E não há necessidade de negar às consciências o título de conhecimento, mesmo que elas não entrem no escopo da observação de Sellars sobre esse conceito. Podemos reservar o conceito do conceitual para usuários da linguagem sem precisar negar que os conceitos cuja aplicação em nosso caso implica as operações de nossas capacidades conceituais —tais como os de crença, desejo e conhecimento— também se aplicam, sem essas implicações, nas vidas de não usuários da linguagem.

Sellars destaca criaturas com linguagem como únicas em serem capazes de “pensamento” em um certo sentido. Filósofos que concordam com Sellars sobre a significância da linguagem frequentemente se consideram obrigados a sustentar que a aplicação de conceitos como os de crença e consciência a criaturas sem linguagem, e portanto sem pensamento no sentido relevante, é um tipo de cortesia, que não deve ser levada a sério. O exemplo estrela disso é Descartes, que concebe brutos irrefletidos como meros autômatos.5 Mas não há nada na forma fundamental do nominalismo psicológico de Sellars que exija esse tipo de movimento.

Se fizermos da linguagem um requisito para ocupar o espaço das razões estritamente assim chamadas, insistimos em uma descontinuidade na vida animal, entre nossas vidas e as de todos os outros animais (pelo menos até onde sabemos). O que tenho insistido é que isso não nos impede de também reconhecer uma continuidade. Não precisamos supor que a relação entre uma razão e o que é uma razão para surge do nada com o início da linguagem. Ela tem precursores inteligíveis nas relações entre objetivos, consciências e comportamento que já moldam trechos da vida de animais sem linguagem.

Não quero dizer que toda a verdade sobre o que é necessário para um sujeito estar no espaço das razões no sentido estrito se esgota pelo fato de o sujeito ser responsivo, de uma forma que permita recuar e levantar questões críticas, a circunstâncias à luz das quais o comportamento meramente animal, sem a orientação distanciada, de qualquer forma teria feito sentido. Pelo contrário, há claramente mais em vir a ocupar o espaço das razões do que essa transfiguração da inteligência prática. Sugeri que é a capacidade de dizer como as coisas são que permite uma atitude distanciada em relação a uma característica do ambiente de alguém. A capacidade de dizer como as coisas são pressupõe responsividade a razões teóricas. E isso põe em jogo extensões do espaço das razões que, ao contrário das razões práticas mais básicas, não têm contrapartida na formação das vidas de animais não racionais.

Falei sobre restringir o conceito do conceitual aos ocupantes do espaço de razões no sentido estrito de Sellars. É importante deixar claro que esta é uma escolha terminológica. Não é opcional, no pensamento de Sellars, marcar a descontinuidade entre ocupantes do espaço de razões no sentido estrito e tudo o mais. Desistir disso seria abandonar o nominalismo psicológico. Mas não é obrigatório marcar a descontinuidade negando capacidades conceituais a animais não racionais. Algumas pessoas preferem alinhar o conceito do conceitual com a continuidade que estou insistindo que não precisamos negar ou minimizar, de modo que o comportamento de voo inteligente de um animal, por exemplo, possa mostrar que ele possui o conceito de perigo. A concepção restrita do conceitual que estou encontrando em Sellars não deve ser vista como tendo problemas com essa preferência em uma questão de fato. Não é que a posse de capacidades conceituais constitua um tipo natural independentemente identificável —como, digamos, a posse de polegares opositores— com a escolha entre a maneira sellarsiana de falar e essa alternativa se voltando para questões substantivas sobre quão ampla é a extensão do tipo. A questão aqui é, antes, entre duas estipulações diferentes sobre a maneira mais útil de empregar algo que deve ser visto como um termo de arte.

§5. Quando Sellars introduz o espaço de razões, ele está dando expressão a um internalismo epistemológico robusto, pelo menos sobre o conhecimento na aplicação que pertence ao espaço de razões no sentido primário. Se o conhecimento é uma posição no espaço de ser capaz de justificar o que se diz, então alguém que faz uma afirmação que conta como expressão de conhecimento precisa ser capaz de reivindicar seu direito à afirmação. Então ela precisa estar ciente do direito. Contraste o externalismo epistemológico segundo o qual pode ser suficiente para uma crença contar como conhecimento se ela resultar de uma maneira de adquirir crenças que podem ser confiáveis, nas circunstâncias, para resultar em crenças verdadeiras, mesmo que esse fato sobre a procedência da crença esteja além do conhecimento do crente.

O internalismo epistemológico de Sellars é comparativamente não problemático no caso do conhecimento inferencial, onde se sabe algo em virtude de saber outra coisa da qual há uma boa inferência para a crença que, portanto, conta como conhecimento. Não seria tentador supor que se poderia ter conhecimento desse tipo sem estar ciente de suas credenciais. Mas o conhecimento adquirido por meio da observação não é precisamente baseado em inferências, e para esses casos o internalismo de Sellars necessita de uma complexidade em como entendemos a imagem do espaço de razões.

Em uma interpretação superficialmente atraente da imagem, as relações no espaço de razões —os análogos às relações entre posições no espaço literalmente assim chamadas— são constituídas por possibilidades de alcançar posições de direito ou comprometimento por inferência de posições anteriores de direito ou comprometimento. Isso torna difícil combinar o internalismo de Sellars, sua insistência de que um conhecedor deve ser capaz de exibir sua própria postura como uma de crença intitulada, com a preservação de uma aplicação para a ideia de conhecimento não inferencial. Assim, Robert Brandom, que assume que a construção inferencial da imagem,6 pensa que tolerar o conhecimento não inferencial, como Sellars certamente quer, requer uma exceção ao internalismo que Sellars também quer endossar.7

Confiabilidade é pelo menos uma condição necessária para que uma crença conte como resultado de observação. Isso pode ser enquadrado em termos de uma certa inferência, e o próprio Sellars coloca as coisas dessa forma (§35). Se uma crença é o resultado de observação, então que as coisas são como se acredita que sejam é a conclusão de uma boa inferência da inclinação do sujeito, nas circunstâncias, a dizer que as coisas são dessa forma. Isso abre espaço para uma justificativa inferencial para a crença. Mas, como Brandom insiste, uma justificação inferencial nessas linhas pode ser oferecida pelo próprio crente, na melhor das hipóteses, ex post facto, sob pena de perdermos o controle sobre o fato de que o conhecimento que estamos considerando deveria ser não inferencial.8 Não conseguimos imaginar uma postura observacional com relação a algum estado de coisas se imaginarmos um crente que se convence de que tem direito a uma crença apelando para a “inferência de confiabilidade”, nessas linhas: “Eu me sinto inclinado a dizer que este livro é vermelho e, dada minha confiabilidade sobre tais assuntos em circunstâncias como essas, há uma boa inferência para a conclusão de que ele é vermelho, então irei em frente e afirmarei que ele é vermelho”.

Sellars impõe uma segunda condição necessária ao conhecimento observacional, além da condição de confiabilidade. A segunda condição (§35) é que um conhecedor observacional deve estar autoconscientemente em posse da autoridade observacional que Sellars explicita em termos de “inferência de confiabilidade”. Obviamente, isso reflete o internalismo epistemológico de Sellars. Agora, Brandom pensa que esse requisito internalista implicaria uma imagem inferencial autodestrutiva do suposto conhecimento observacional — como se alguém chegasse ao conhecimento observacional como resultado de persuadir a si mesmo, por meio da “inferência de confiabilidade”, que seria justificado em ceder a uma inclinação para dizer algo, presente a alguém em primeira instância como um mero fenômeno não acompanhado pela confiança de que estaria falando a verdade se cedesse à inclinação. Então Brandom conclui que o requisito internalista é um erro da parte de Sellars. Devemos deixá-lo de lado se quisermos nos apegar ao próprio pensamento de Sellars de que o conhecimento observacional não é inferencial. Um conhecedor observacional pode invocar sua própria confiabilidade somente ex post facto. É um pequeno passo daqui para alegar, como Brandom de fato faz, que o caso continua sendo um de conhecimento observacional se o próprio crente não estiver em posição de invocar sua confiabilidade mesmo ex post facto. De acordo com Brandom, é suficiente se outra pessoa, um marcador de pontuação, puder colocar a crença no espaço das razões como a conclusão de uma inferência envolvendo a confiabilidade do sujeito, mesmo que o próprio crente não se considere confiável.9

Na visão de Brandom, então, o internalismo sem exceções de Sellars é um erro. Não pode ser feito para ser coerente com o resto do que Sellars quer.

Penso que isso passa por cima do ponto principal de Sellars na parte VIII crucial de “Empiricism and the Philosophy of Mind”, da qual citei suas condições necessárias para o conhecimento observacional. Encerrarei este artigo esboçando como os movimentos de Sellars ali mostram que, ao contrário da sugestão de Brandom, ele pode de fato ter tudo o que quiser. Isso requer dar plena medida a uma complexidade na maneira como o próprio Sellars explicita a imagem do espaço de razões, o que não é adequadamente acomodado pela interpretação inferencialista da imagem de Brandom.

O objetivo geral da parte VIII é identificar e corrigir o erro no “empirismo tradicional” (§38), que responde à pergunta do título, “O conhecimento empírico tem uma fundação?”, com um “sim” incondicional. Sellars descreve o “empirismo tradicional” assim (§32):

Uma das formas assumidas pelo Mito do Dado é a ideia de que há, de fato deve haver, uma estrutura de matéria de fato particular tal que (a) cada fato não só pode ser conhecido não inferencialmente como o caso, mas não pressupõe nenhum outro conhecimento de matéria de fato particular, ou de verdades gerais: e (b) … o conhecimento não inferencial de fatos pertencentes a essa estrutura constitui o tribunal de apelações final para todas as alegações factuais —particulares e gerais— sobre o mundo.

O ponto crucial é que o conhecimento fundamental é concebido como não pressupondo nenhum outro conhecimento. É isso que faz disso uma forma do Mito do Dado. O ataque de Sellars ao Mito, em sua aparência empirista, pode ser resumido assim. Primeiro, adquirir conhecimento não inferencialmente é, não menos do que adquirir conhecimento inferencialmente, um exercício de capacidades conceituais. (É claro que isso se relaciona apenas à aplicação do conceito de conhecimento que pertence ao espaço das razões no sentido primário. Fora desse contexto, a distinção entre conhecimento inferencial e não inferencial não tem força.) Segundo, as capacidades conceituais não são inatas, ou desenvolvidas na mera maturação biológica, mas adquiridas no aprendizado de uma língua. (Este é o nominalismo psicológico de Sellars.) E terceiro, mesmo no caso daqueles conceitos que podem parecer mais congeniais ao atomismo do empirismo tradicional, a própria posse dos conceitos requer conhecimento de muito mais do que é declarado quando se dá expressão às aplicações deles. Por exemplo, para ter conceitos de cores, é preciso saber quais condições são apropriadas para dizer qual é a cor de algo olhando para ele (ver §19).

O conhecimento de qual é a cor de algo, adquirido ao observá-lo sob uma boa luz, não é inferencial. É um exemplo de uma categoria de conhecimento, o observacional, que constitui o tribunal de apelações final para todas as alegações factuais sobre o mundo. Essas duas frases ensaiam dois terços da concepção empirista tradicional de conhecimento observacional. A correção necessária ao empirismo tradicional é desistir do outro terço, desistir da ideia de que tal conhecimento pode ser obtido em pedaços autocontidos, pressupondo nenhum outro conhecimento. E isso requer uma resposta “Sim e não” à questão se o conhecimento empírico tem fundamentos, em vez do “Sim” incondicional do empirismo tradicional. Sellars coloca sua atitude matizada para a imagem de fundamentos assim (§38):

Se eu rejeito a estrutura do empirismo tradicional, não é porque eu queira dizer que o conhecimento empírico não tem fundamento. Pois colocar dessa forma é sugerir que ele é realmente “conhecimento empírico assim chamado”, e colocá-lo em uma caixa com rumores e fraudes. Há claramente algum ponto na imagem do conhecimento humano como apoiado em um nível de proposições —relatórios de observação— que não se apoiam em outras proposições da mesma forma que outras proposições se apoiam nelas. Por outro lado, eu desejo insistir que a metáfora de “fundação” é enganosa, pois nos impede de ver que se há uma dimensão lógica na qual outras proposições empíricas se apoiam em relatórios de observação, há outra dimensão lógica na qual as últimas se apoiam nas primeiras.

Dependência nesta segunda dimensão lógica é a pressuposição de outro conhecimento que o empirismo tradicional falha em reconhecer. Ao tomar nota da segunda dimensão, vemos que o que é agora, apenas por esta razão, apenas enganosamente concebido como conhecimento fundamental pressupõe conhecimento de outras questões de fato, que teriam que pertencer à estrutura de conhecimento que é agora apenas enganosamente concebida como construída sobre essas fundações. A metáfora das fundações é enganosa porque não se poderia nem mesmo ter as supostas fundações sem ter começado a construir uma estrutura sobre elas.

Alguém pode saber qual é a cor de algo olhando para ele somente se souber o suficiente sobre os efeitos de diferentes tipos de iluminação nas aparências de cores. O essencial para nossos propósitos é que a relação desse conhecimento pressuposto com o conhecimento que o pressupõe —suporte na segunda dimensão de Sellars— não é que o conhecimento pressuposto seja inferencialmente fundamentado no conhecimento pressuposto. Essa seria a coisa certa a dizer sobre o conhecimento que se baseia em outro conhecimento na primeira dimensão de Sellars, e a segunda dimensão é diferente. Como Sellars diz no início da parte VIII (§32), seu objetivo é atacar a ideia “de que o conhecimento … que logicamente pressupõe o conhecimento de outros fatos deve ser inferencial”. Uma vez que reconhecemos a segunda dimensão, não inferencial, na qual uma proposição pode ser racionalmente favorável a outra, podemos ver que o conhecimento pressuposto pode ser invocado pelo sujeito que tem o conhecimento que o pressupõe — não apenas ex post facto, como na suposta melhoria de Brandom em relação a Sellars, mas na época — sem ameaçar o status do conhecimento pressuposto como não inferencial.

Permanecendo com a mesma instância para ilustrar o ponto: eu poderia pelo menos parcialmente justificar minha alegação de saber que algo é verde —eu poderia adequadamente colocar minha posição, com relação à proposição de que a coisa é verde, no espaço de razões— dizendo “Esta é uma boa luz para dizer as cores das coisas olhando”. Isso pode ser algo relevante a dizer para mostrar que tenho o direito de pronunciar como o faço sobre a cor da coisa. O crucial é que eu não lance o que digo sobre a luz como uma premissa em uma fundamentação inferencial para o que afirmo saber sobre a cor da coisa.

E algo semelhante, embora com uma complexidade extra, precisa ser dito sobre invocar minha própria confiabilidade. Eu posso dizer uma coisa verde quando vejo uma, pelo menos sob uma boa luz, vista de frente, e assim por diante. Um glossário útil sobre essa observação é dizer que se eu afirmo, em circunstâncias adequadas, que algo é verde, então é. Há uma boa inferência do meu dizer assim, nessas circunstâncias, para que seja assim. Como eu disse, é assim que Sellars introduz a condição de confiabilidade no conhecimento observacional. Não se segue que se eu coloco meu pronunciamento de que algo é verde no espaço de razões dizendo “Eu posso dizer uma coisa verde quando vejo uma” — invocando minha posse autoconsciente de autoridade observacional sobre tais questões, em conformidade com a segunda condição necessária de Sellars — eu, portanto, me represento como devendo meu direito à afirmação de que a coisa é verde a uma inferência de uma inclinação que encontro em mim mesmo para dizer que é. Que eu seja confiável sobre tais coisas — se você preferir, que a “inferência de confiabilidade” seja boa neste caso — é uma condição para que eu seja capaz de adquirir conhecimento de que as coisas são verdes olhando. É pressuposto por eu ter conhecimento observacional de que as coisas são verdes. Ele apoia meu conhecimento observacional de que as coisas são verdes na segunda dimensão de Sellars, que ele cuidadosamente separa da dimensão na qual um pedaço de conhecimento fornece base inferencial para outro.10 Não há ameaça ao status não inferencial do conhecimento observacional se insistirmos, como Sellars faz, que meu estar ciente da confiabilidade que é um requisito para que eu tenha autoridade como um observador de cores é uma condição para que eu seja um observador de cores.11

A complicação extra neste caso é que a condição de confiabilidade pode ser explicitada em termos da bondade de uma inferência. Mas isso não faz diferença para o ponto. Sellars insiste que a confiabilidade de alguém deve estar disponível para alguém como algo do qual seu conhecimento observacional depende racionalmente. Isso não é representar o conhecimento observacional em questão como inferencialmente dependente de qualquer coisa: não da própria confiabilidade de alguém, e certamente não da inclinação de alguém para fazer uma afirmação observacional, a premissa da “inferência de confiabilidade”. Então o internalismo de Sellars é coerente com uma concepção perfeitamente intuitiva do conhecimento observacional como não inferencial. O que precisa ser descartado não é o internalismo, mas a compreensão monoliticamente inferencialista de Brandom da topografia do espaço de razões. Isso contradiz a insistência de Sellars nas duas dimensões diferentes nas quais uma proposição pode repousar sobre outra.

Tenho atacado a ideia de Brandom de que precisamos de qualquer forma de uma concessão ao externalismo para conhecimento não inferencial. Essa ideia ajuda a sustentar uma cegueira da parte de Brandom para o papel desempenhado pela experiência, autoconscientemente desfrutada, na concepção internalista de conhecimento observacional de Sellars. Em “Empiricism and the Philosophy of Mind”, Sellars delineia um empirismo não tradicional, não contaminado pelo Mito do Dado. Interpretando mal trechos cruciais do texto, Brandom, ao contrário, considera a deriva de Sellars contra o empirismo como tal, contra a própria ideia de que algo merecedor de ser chamado de “experiência” poderia ser relevante para a aquisição de conhecimento empírico de qualquer forma, exceto meramente causalmente.12 Brandom é encorajado nisso pelo fato de que ele não consegue ver espaço para nenhum internalismo sobre conhecimento observacional, uma vez que a única interpretação para tal internalismo que ele considera não será coerente com o fato de que o conhecimento observacional é não inferencial.

Classificar o papel da experiência na explicação de Sellars sobre o conhecimento observacional é um projeto para uma ocasião diferente. Mas espero ter dito o suficiente para indicar por que, se apreciamos a imagem complexa de Sellars das relações que constituem o espaço das razões, isso ajuda a destacar que há espaço na imagem de Sellars para a experiência desempenhar um papel mais do que meramente causal em uma epistemologia de observação totalmente internalista.

1 Em Herbert Feigl e Michael Scriven, eds., Minnesota Studies in the Philosophy of Science, vol. I (Minneapolis: University of Minnesota Press, 1956); reimpresso em Sellars’s Science, Perception, and Reality (Londres: Routledge and Kegan Paul, 1956; reeditado Atascadero, Ridgeview, 1991); reimpresso como uma monografia, com uma introdução de Richard Rorty e um guia de estudo de Robert Brandom (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1997). Darei citações por números de seção para que possam ser facilmente encontradas em qualquer uma das impressões.

2 Ver “Eventos mentais”, em Ensaios sobre ações e eventos de Davidson (Oxford: Clarendon Press, 1980).

3 Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1994; reeditado com uma nova introdução, 1996.

4 Traduzido por GEM Anscombe (Oxford: Blackwell, 1951).

5 Compare também Richard Rorty, Philosophy and the Mirror of Nature (Princeton: Princeton University Press, 1979), pp. 188–92; e Robert Brandom, “Knowledge and the Social Articulation of the Space of Reasons”, Philosophy and Phenomenological Research lv (1995), pp. 899–900 (n. 3).

6 Na p. 158 de seu Guia de Estudo, Brandom formula o internalismo de Sellars como implicando que “para um relato não inferencial expressar conhecimento (ou para a crença que ele expressa constituir conhecimento), o relator deve ser capaz de justificá-lo, exibindo razões para isso”. As últimas cinco palavras aqui já são suspeitas, e fica claro que as coisas estão indo mal quando Brandom continua: “Isso quer dizer que o relator deve ser capaz de exibi-lo como a conclusão de uma inferência, mesmo que não seja assim que o comprometimento surgiu originalmente”. Isso reflete a suposição de que as relações no espaço de razões são esgotadas por possíveis rotas inferenciais de uma posição para outra.

7 Veja, por exemplo, “Knowledge and the Social Articulation of the Space of Reasons”, especialmente na p. 904, onde Brandom afirma que os relatórios não inferenciais trazem uma visão sobre abordagens externalistas à epistemologia.

8 Ver “Insights and Blind Spots of Reliabilism”, em Articulating Reasons: An Introduction to Inferentialism (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 2000), especialmente nas pp. 103–4 e p. 211, n. 3.

9 Veja Making It Explicit: Reasoning, Representing, and Discursive Commitment (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1994), pp. 217–21. A ideia é sugerida no Guia de Estudo de Brandom para “Empiricism and the Philosophy of Mind”; veja pp. 157, 159.

10 O Guia de Estudo de Brandom quase não faz nada sobre isso. Brandom explica quase exclusivamente as observações de Sellars contra uma concepção atomística de conhecimento não inferencial em termos de um requisito para entender relatórios observacionais, que alguém seja capaz de usar as formas relevantes de palavras também como premissas e conclusões de inferências. Certamente há tal requisito, mas não é a preocupação de Sellars na parte VIII (ou mesmo em qualquer lugar em “Empiricism and the Philosophy of Mind”). A preocupação de Sellars é um requisito para que os relatórios observacionais sejam expressões inteligíveis do conhecimento observacional; para esses propósitos, que eles sejam compreendidos por alguém que os faz pode ser dado como certo. E a relação entre o conhecimento observacional da cor de algo e, digamos, o conhecimento sobre circunstâncias adequadas para dizer cores olhando — o primeiro exemplo de Sellars do tipo de coisa com que ele está preocupado — não é inferencial. Na p. 162, expondo §38, Brandom não consegue evitar deixar um vislumbre do ponto real de Sellars emergir, quando ele diz que os relatórios de observação “eles mesmos repousam (não inferencialmente, mas na ordem de compreensão e às vezes de justificação) em outros tipos de conhecimento”. (É por isso que eu disse que ele quase não faz nada sobre o ponto.) Mas a ênfase na ordem de compreensão é uma importação. E nada no resto do que Brandom diz sobre a parte VIII explica ou garante o pensamento que de repente faz sua aparição aqui, que os relatórios de observação podem depender na ordem de justificação, mas não inferencialmente, em outros tipos de conhecimento. Isso —com “sempre” em vez de “às vezes”— é apenas a tese de Sellars. O ponto contradiz a interpretação inferencialista de Brandom do espaço de razões (a ordem de justificação), e destrói a suposta base para a ideia de Brandom de que o internalismo de Sellars é um erro.

11 Sellars pensa que alguém precisa de fundamentos indutivos para a proposição de que alguém é confiável, e ele trabalha (§§36, 37) para evitar representar a capacidade de emprego observacional de um conceito, que ele está insistindo que requer consciência da própria confiabilidade, conforme necessário antecipadamente para acumular os fundamentos indutivos. (Isso seria circular, como ele observa.) Mas eu acho que a ideia de que a confiança na própria confiabilidade de alguém precisa de fundamentos indutivos é um erro. De qualquer forma, não precisamos considerar essa questão para apreciar a forma ampla do pensamento de Sellars sobre o conhecimento observacional.

JOHNMCDOWELL
Departamento de Filosofia
Universidade de Pittsburgh
1017 Cathedral of Learning
Pittsburgh, PA 15260
jmcdowel@pitt.edu


1) Problema filosófico que está sendo tratado

O problema central que McDowell aborda no artigo é a relação entre a experiência e o conhecimento dentro de um quadro filosófico. A questão é: Como a experiência sensorial pode justificar o conhecimento?

Problema central: Tradicionalmente, o empirismo defendia que o conhecimento é obtido a partir da experiência direta dos sentidos, ou seja, nossos sentidos captam dados do mundo e, a partir deles, formamos conhecimento. No entanto, Sellars, segundo McDowell, argumenta que essa visão é problemática porque envolve o que ele chama de “Mito do Dado”: a ideia de que podemos obter conhecimento apenas pela experiência sensorial bruta, sem qualquer intervenção conceitual ou racional.

O desafio filosófico aqui é como integrar a experiência sensorial (o que vemos, ouvimos, sentimos) dentro de uma estrutura que envolve conceitos e justificações. Como podemos dizer que algo que percebemos é verdadeiro e constitui conhecimento sem depender apenas de um “dado” sensorial bruto, que poderia ser enganoso ou incompleto?

Problema: Como a experiência sensorial pode justificar o conhecimento?

Exemplo: Imagine que você está segurando uma maçã e a vê como vermelha. No empirismo tradicional, você poderia pensar que apenas o fato de ver a maçã vermelha já seria suficiente para você “saber” que a maçã é vermelha. Entretanto, Sellars argumenta que isso não é tão simples. Você não pode simplesmente confiar na percepção bruta (no “dado sensorial”) porque a percepção pode enganar você (luzes podem distorcer cores, sua visão pode estar comprometida, etc.). Assim, o problema filosófico é: como saber que o que percebemos (a maçã vermelha) é verdadeiro e justificado? Como podemos garantir que nossa percepção não nos engana?

Explicação com exemplo: Imagine que você está em uma sala com iluminação fraca, e vê a maçã como vermelha. Nesse caso, você precisaria de mais do que apenas o ato de “ver” a cor. Você precisaria ter certeza de que a luz na sala não está distorcendo sua percepção ou de que sua visão está funcionando adequadamente. Assim, a percepção precisa ser justificada por conceitos e razões, não apenas dada pela experiência visual imediata.

 


2) Em que consiste o argumento de Sellars segundo McDowell para tratar o problema filosófico?

Sellars oferece uma solução para esse problema por meio da sua crítica ao “Mito do Dado” e da introdução do conceito de “espaço das razões”.

Crítica ao “Mito do Dado”: Sellars rejeita a ideia de que a percepção sensorial nos oferece um tipo de dado puro e inquestionável que pode servir como base do conhecimento. Ele argumenta que, para algo ser considerado conhecimento, ele precisa ser justificado dentro de um contexto conceitual. Ou seja, para saber que “essa maçã é vermelha”, não basta simplesmente ver a cor vermelha — é preciso ter o conceito de “vermelho”, saber que estamos em condições adequadas de luz, entender a relação entre o que vemos e o que isso significa.

Espaço das Razões: Sellars argumenta que o conhecimento se insere em um “espaço das razões”, um domínio em que nossas crenças, percepções e afirmações precisam ser justificadas racionalmente. Isso significa que o ato de conhecer algo envolve a capacidade de dar razões para o que sabemos. Assim, nossa experiência sensorial não é apenas uma fonte passiva de dados, mas é sempre mediada por conceitos e deve ser integrada em um quadro racional.

Epistemologia internalista: Sellars defende que, para termos conhecimento, precisamos estar cientes das justificativas para nossas crenças. Isso é uma forma de internalismo — o sujeito precisa ser capaz de fornecer razões para sua crença.

Em resumo, o argumento de Sellars, segundo McDowell, é que não podemos simplesmente confiar em uma percepção sensorial bruta como fonte de conhecimento, porque ela não nos fornece justificativas racionais por si só. A experiência sensorial precisa ser entendida dentro de um quadro conceitual e racional — o espaço das razões — para se tornar conhecimento.

Argumento de Sellars: Não podemos confiar na experiência sensorial bruta como fonte de conhecimento (o que ele chama de “Mito do Dado”). A percepção precisa ser mediada por conceitos e estar dentro de um contexto racional de justificativas, ou seja, no espaço das razões.

Exemplo: Voltemos ao exemplo da maçã vermelha. Digamos que você esteja em um mercado e veja uma maçã que parece vermelha. De acordo com Sellars, você não está simplesmente “vendo” um dado sensorial. Sua percepção já está sendo influenciada por uma série de conceitos: você já sabe o que é uma maçã, o que significa a cor vermelha, sabe que a iluminação no mercado está boa, que você não tem problemas de visão, etc. Tudo isso contribui para que sua percepção seja justificável.

Explicação com exemplo: Imagine que você está em um museu de ilusionismo, onde as luzes são manipuladas para fazer objetos parecerem diferentes. Sellars diria que, para saber que a maçã é realmente vermelha, você precisa mais do que apenas “ver” a cor. Você precisa saber que as condições são adequadas para perceber a cor corretamente (boa iluminação, ângulo correto, etc.). Isso mostra que sua percepção não é “pura”, mas envolve conceitos e justificações racionais.

 


3) Quais são as objeções ao argumento de Sellars apresentadas por McDowell no artigo?

McDowell apresenta várias objeções ou questões complicadas que surgem do argumento de Sellars, especialmente a partir das leituras de outros filósofos, como Robert Brandom. As principais objeções incluem:

A experiência sensorial não parece caber facilmente no “espaço das razões”: Uma crítica comum é que a experiência sensorial parece mais passiva e imediata do que as justificações racionais. Como a mera percepção de algo pode estar inserida no “espaço das razões”, que envolve conceitos e justificações? McDowell reconhece que parece haver uma lacuna entre ver algo e justificar o que se vê, e isso torna o argumento de Sellars mais difícil de defender.

O problema do conhecimento não-inferencial: Outra objeção importante, apresentada por Robert Brandom e discutida por McDowell, é que Sellars parece exigir uma justificativa conceitual até mesmo para o conhecimento perceptivo imediato. Isso cria uma tensão, porque o conhecimento perceptivo é, muitas vezes, não-inferencial (ou seja, não baseado em outras crenças ou justificações). Como, então, podemos ter conhecimento perceptivo direto se tudo no espaço das razões parece exigir algum tipo de inferência ou justificação?

A experiência como “meramente causal”: Brandom vai além e sugere que, se aceitarmos que a experiência está dentro do espaço das razões, podemos acabar concluindo que a experiência não tem nenhum papel justificativo, mas apenas um papel causal. Nesse sentido, a experiência apenas causa crenças em nós, mas não justifica essas crenças. Isso vai contra a ideia de que a experiência sensorial pode fornecer razões para nossas crenças.

Objeção 1: A experiência sensorial não parece caber facilmente no “espaço das razões”. A objeção é que a experiência sensorial (ver uma maçã vermelha) parece ser mais imediata e passiva, enquanto o espaço das razões é ativo e racional. Como uma percepção pode fazer parte do espaço das razões, que envolve justificação racional?

Exemplo: Pense em uma criança pequena que ainda está aprendendo sobre cores. Quando ela vê uma maçã vermelha, pode identificar a cor sem pensar muito nisso. A objeção aqui seria que a criança não está necessariamente “justificando” sua percepção. Ela simplesmente vê a cor, sem nenhuma reflexão conceitual. Isso sugere que a percepção sensorial é algo direto e não envolve justificações racionais complexas.

Objeção 2: O problema do conhecimento não-inferencial. Como podemos ter conhecimento perceptivo imediato se tudo dentro do espaço das razões parece exigir uma justificação inferencial? Afinal, ver que uma maçã é vermelha não parece envolver uma cadeia de inferências.

Explicação com exemplo: Imagine que você vê a maçã vermelha no mercado e imediatamente sabe que ela é vermelha. Você não parece precisar de uma longa reflexão sobre sua percepção — simplesmente sabe que ela é vermelha. A objeção aqui é que, se toda percepção requer uma justificação racional, o que acontece com esse tipo de conhecimento imediato?

 


4) Quais são as respostas dadas pelo próprio McDowell a essas objeções ou quais as respostas dadas por Sellars segundo McDowell a elas?

McDowell apresenta uma defesa cuidadosa do argumento de Sellars e responde às objeções de várias maneiras:

Integração da experiência sensorial no espaço das razões: McDowell argumenta que a experiência sensorial pode, sim, ser parte do espaço das razões. Para ele, quando percebemos algo (como a cor de uma maçã), essa percepção já envolve conceitos e já está integrada no espaço das razões. A percepção não é algo puramente passivo e bruto; ao contrário, ao perceber, estamos sempre interpretando o que vemos com base em conceitos previamente adquiridos. Isso significa que a experiência sensorial não é apenas causal — ela já participa da justificação racional.

Conhecimento não-inferencial: McDowell rejeita a ideia de que Sellars exige uma inferência para o conhecimento perceptivo. Ele argumenta que podemos ter conhecimento perceptivo direto (como ver a cor de uma maçã) sem precisar de uma inferência formal. No entanto, esse conhecimento perceptivo ainda é conceitualmente mediado, ou seja, ele está fundamentado em nossa capacidade de entender e aplicar conceitos ao que percebemos.

Resgate do empirismo: McDowell propõe que podemos resgatar o empirismo, mas de uma forma “não-tradicional”, como Sellars sugere. A experiência sensorial, para McDowell, ainda tem um papel importante no conhecimento, mas ela não é dada de forma pura e bruta. Em vez disso, ela já está envolvida em um processo de interpretação conceitual.

Resposta ao papel causal da experiência: McDowell afirma que Brandom está errado ao sugerir que a experiência tem apenas um papel causal. Para McDowell, a experiência tem um papel justificativo, mas precisamos entendê-la de maneira mais sofisticada — ela justifica nossas crenças porque já vem carregada de conceitos. Ao perceber algo, já estamos operando no “espaço das razões”, mesmo que de maneira não-inferencial.

Resposta de McDowell: A experiência sensorial já faz parte do espaço das razões, porque ela é conceitualmente mediada. Mesmo quando temos percepções aparentemente imediatas, como ver que uma maçã é vermelha, isso já envolve conceitos que adquirimos anteriormente. A percepção não é passiva; ela é sempre interpretada dentro de um contexto conceitual.

Exemplo: Quando você vê uma maçã e a identifica como vermelha, você está usando conceitos de “vermelho”, “maçã”, “luz adequada” e outros. Mesmo que você não precise pensar ativamente sobre isso, esses conceitos estão presentes. Para McDowell, a experiência sensorial não é uma base puramente causal, mas já envolve conceitos que você utiliza automaticamente para interpretar o que vê.

Explicação com exemplo: Imagine que você está dirigindo à noite e vê um semáforo verde. Você não precisa parar para “justificar” que a luz é verde — você já sabe o que o verde significa e age automaticamente com base nisso. No entanto, McDowell argumentaria que isso ainda envolve conceitos e justificações. Você sabe que o semáforo está verde porque entende o conceito de “verde” e sabe que a iluminação ao redor está adequada para você perceber as cores corretamente. Isso significa que mesmo percepções rápidas e imediatas fazem parte do espaço das razões.

Resposta ao problema do conhecimento não-inferencial: McDowell argumenta que podemos ter conhecimento perceptivo não-inferencial sem precisar de uma longa cadeia de raciocínio. A percepção pode ser direta, mas ainda é conceitualmente mediada. Por exemplo, quando você vê a maçã vermelha, você não precisa inferir racionalmente a cor, mas ainda assim sua percepção está enraizada em um quadro conceitual.

Explicação com exemplo: Imagine que você está em uma galeria de arte olhando para uma pintura. Você vê imediatamente que a cor predominante é azul, sem precisar de uma análise detalhada. No entanto, sua capacidade de ver e entender que é azul ainda depende de seu conhecimento prévio de cores, de sua visão estar funcionando corretamente e de estar em condições adequadas de luz. Assim, a percepção é não-inferencial, mas ainda justificável.

 


Conclusão

Resumindo, o artigo trata de um problema profundo sobre a relação entre a experiência e o conhecimento. Sellars, segundo McDowell, oferece uma solução poderosa ao rejeitar o “Mito do Dado” e defender que a experiência precisa ser integrada no espaço das razões para constituir conhecimento. McDowell responde às críticas a Sellars mostrando que a experiência sensorial pode ser conceitualmente mediada e justificativa, e não apenas causal, oferecendo uma defesa robusta da posição de Sellars.

Através desses exemplos práticos, podemos entender melhor os conceitos discutidos por McDowell e Sellars:

O problema é sobre como a experiência sensorial se torna conhecimento justificado.

Sellars argumenta que a experiência precisa ser conceitualmente mediada e estar no espaço das razões.

As objeções surgem quando pensamos que a percepção sensorial parece ser imediata e não racional, mas McDowell responde que a percepção já é interpretada através de conceitos, mesmo que não percebamos isso conscientemente.

Esses exemplos conectam os conceitos filosóficos a situações do cotidiano, o que pode tornar a compreensão dos argumentos de Sellars e McDowell mais concreta e acessível.

 

Be the first to comment on "Artigo: McDowell – Sellars and the space of reasons"

Leave a comment