CAPÍTULO I – QUAIS OS GÊNEROS DE PRINCIPADO E POR QUE MEIOS SÃO CONQUISTADOS
“Todos os Estados, todos os domínios que tiveram e têm poder sobre os homens foram e são repúblicas ou principados.”
“E os principados são: ou hereditários ou novos. E, entre os novos, ou são novos de todo ou são constituídos de membros agregados ao Estado hereditário do príncipe que os conquista.”
“Assim são ordenados tais domínios, uns habituados a viver sob um príncipe (principados), outros acostumados a serem livres (repúblicas); e eles são conquistados ou por armas alheias ou por armas próprias, ou por fortuna ou por virtude”.
Comentários: No primeiro capítulo o autor introduz sua obra, que tratará dos principados e suas duas formas em que se apresentam: hereditários e novos; das formas como estes são conquistados: ameaças externas ou internas; e como também quanto à motivação dessas conquistas: se por fortuna ou virtude.
CAPÍTULO II – DOS PRINCIPADOS HEREDITÁRIOS
“Digo, pois, que nos Estados herdados as dificuldades em mantê-los são bem menores que nos Estados novos”. … e mais adiante: “Por que o soberano natural tem menores motivos e menos necessidade de ofender, donde é mais fácil que seja querido; e, se extraordinários vícios não o tornem odiado, é razoável que, naturalmente, ele seja benquisto pelos seus”.
Comentários: Neste segundo capítulo o autor ressalta a diferença quanto ao grau de dificuldade em se manter o poder nos Estados herdados e nos Estados Novos, que possivelmente implicará em tratamentos diferentes a serem relatados pelo autor nos capítulos seguintes.
CAPÍTULO III – DOS PRINCIPADOS MISTOS
“Mas é no principado novo que consistem as dificuldades. Primeiramente se ele não for de todo novo, mas um membro agregado a um Estado hereditário.”
“… pois o novo príncipe sempre precisará oprimir os novo súditos, seja com suas tropas, seja com as infinitas violações que uma conquista recente implica: de modo que se transformam em inimigos todos aqueles que o novo príncipe ofendeu a ocupar aquele domínio, sem que seja possível manter a amizade dos que o ajudaram a conquistá-lo, haja vista que é impossível satisfazer todas as suas pretensões e também não se pode lançar medidas energéticas contra estes, posto que se tem uma dívida com eles; isso por que, ainda que seus exércitos sejam poderosíssimos, sempre será necessário o favor dos provincianos para se entrar numa província.”
Comentários: Nestes trechos o autor ressalta as dificuldades existentes quando na ocupação de um domínio hereditário, principalmente, quanto ao fato de atender as expectativas posteriores à ocupação daqueles que o ajudaram na conquista.
“E quem os conquistar, se quiser preservá-los, deverá respeitar duas regras: a primeira é que o sangue do príncipe anterior seja extinto; a segunda, não alterar as velhas leis nem os impostos – e assim, em brevíssimo tempo, o principado novo se tornará um só corpo com o antigo.”
Comentário: Aqui o autor refere-se às estratégias para manter Estados conquistados de um mesmo país, que falam ou não a mesma língua, mas que possuem hábitos semelhantes.
“Porém, quando se conquistam territórios de uma província com línguas, costumes e leis contrastantes, aqui surgem dificuldades, e aqui é preciso ter grande sorte e grande engenho para mantê-los.”
“Um dos melhores e mais eficazes meios seria que o conquistador fosse habitar ali; isso tornaria mais seguro e mais durável seu domínio, porque, estando presente o soberano, as desordens são percebidas no nascedouro, e é possível remediá-las a tempo; já em sua ausência os distúrbios só são notados quando não há mais remédio.”
“O segundo melhor remédio é enviar colônias para um ou dois postos estratégicos da província anexada; ou se faz isso, ou será preciso manter ali uma tropa numerosa. Com as colônias não se gasta muito, já que elas podem ser assentadas e mantidas com pouca ou nenhuma despesa. No entanto, se em lugar de colônias se preferirem as tropas, os gastos serão mais elevados, despendendo-se com as milícias todas as receitas do Estado, de maneira que a conquista se reverterá em perda; de resto, tal medida é bem mais ofensiva, porque prejudica toda a população, descontentando a cada um e transformando todos em inimigos. Portanto, sob todos os aspectos, as guarnições são inúteis na mesma medida em que as colônias são úteis.”
Comentário: Nestes trechos autor fala das diferenças entre as estratégias existentes para se manter o poder na província conquistada quando essa possui língua, costumes e leis contrastantes, e que precisam ser mudadas para exercício do poder do novo príncipe. Nesse caso, ao autor destaca a formação de colônias como uma estratégia economicamente superior no lugar do estabelecimento de tropas militares na província conquistada.
“Nas províncias que conquistaram, os romanos respeitaram sempre essa regra: enviaram colônias, obsequiaram os menos poderosos sem permitir que se torna-sem mais fortes, submeteram os potentados e não deixaram que as forças estrangeiras ganhassem influência no território.”
“Nesses casos, os romanos fizeram o que todos os príncipes sábios devem fazer: não se concentrar apenas nos distúrbios presentes, mas também nos futuros, fazendo de tudo para evitá-los, pois com a prevenção é possível remediá-los mais facilmente. É como a tísica, que segundo os médicos, a princípio é fácil de tratar e difícil de diagnosticar, mas com o passar do tempo, não tendo sido diagnosticada nem tratada precocemente, se torna fácil reconhecer e difícil de curar.”
Comentário: Nestes trechos o autor reforça a necessidade da presença do novo principado na província conquistada, como medida de prevenção de conflitos com o propósito de adiar o máximo possível a guerra em favor de outrem.
CAPÍTULO IV – POR QUE O REINO DE DARIO, OCUPADO POR ALEXANDRE, NÃO SE REBELOU CONTRA SEUS SUCESSORES APÓS A MORTE DESTE
“Todos os principados que deixaram memória de si foram governados de dois modos diversos: ou por um príncipe e seus súditos; ou por um príncipe e vários barões, os quais, não por graça do soberano, mas por antiguidade de sangue, mantêm aquele título. Esses barões tem seus próprios Estados e súditos, que reconhecem como senhores e lhes devotam uma natural afeição. Os Estados que são governados por um único príncipe se seus súditos concentram maior autoridade na figura do príncipe.”
“Em nossos tempos, os exemplos relativos a esses dois tipos de governos são a Turquia e a França. Toda monarquia turca é governada por um único senhor, e os demais são seus súditos. Mas o rei da França está posto no centro de uma pletora de antigos nobres, reconhecidos por seus vassalos e amados por eles em seus domínios. Portanto, ver-se-á que é mais difícil conquistar o Estado turco; porém uma vez vencido, será muito mais fácil mantê-lo. Ao contrário, o reino da França se apresenta bem mais fácil de ser conquistado, mas muito mais difícil de ser mantido.”
Comentários: Nestes trecho o autor exemplifica a diferença em relação ao grau de dificuldade de conquistar e manter um domínio, quando todos súditos deste domínio possuem uma identificação direta com o príncipe ou quando este domínio possui sub-divisões de poder, cada uma com seus súditos. Enquanto o “dividir para conquistar” torna esse último mais fácil de ser conquistado, é, por outro lado, mais difícil de ser mantido, pois o novo príncipe não possui uma unidade de poder (ocorrendo o contrário no domínio coeso).
CAPÍTULO V – DE QUE MODO ADMINISTRAR OS PRINCIPADOS QUE, ANTES DE SEREM CONQUISTADOS, TINHAM SUAS PRÓPRIAS LEIS
“Quando conquistados, se tais Estados estão a viver sob suas próprias leis e em liberdade, há de se respeitar três regras caso se queira mantê-los: a primeira, arruiná-los; a segunda, ir habitá-los pessoalmente; a terceira, deixar viver sob suas leis, mas auferindo tributos e criando ali um governo oligárquico, que os mantenha fiéis.”]
“Quando as cidades ou as províncias estão acostumadas a viver sob um príncipe e o sangue deste é extinto, desprovidas do antigo príncipe são incapazes de fazer um soberano e viver livres não o sabem; de modo que demoram mais a rebelar-se, e, com mais facilidade um príncipe pode abatê-las e apossar-se delas. Já as repúblicas há mais vida, mais ódio, há mais desejo de vingança; a memória da antiga liberdade não as abandona nem lhes dá descanso, de modo que a via mais segura é aniquilá-las ou habitá-las.”
Comentários: Nos trechos deste capítulo o autor apresenta a estratégia quando a instauração de um principado em uma república conquistada. Diferentemente caso fosse se o domínio conquistado fosse um principado, neste caso o autor sugere três regras que devem ser observadas, que tem como objetivo a desestruturação do domínio a tal ponto que seus habitantes não tenham condições, por um bom tempo, de organizar-se novamente em rebeliões em prol da liberdade.
Be the first to comment on "O Príncipe de Maquiavel – Capítulos I à V"